sábado, março 18, 2006

valdir - o motorista de ônibus

tchhh tchhhh tchhhhh fommmmmm fommmmmmmm!!!!
- ah vá se fudê seu bosta!
piiiiiii.
- é nesse agora?
- é!
- valeu motor!
"valeu o caralho seu merda." pensou valdir. o trânsito do parque laje até o hospital da lagoa hoje estava fora do normal - andava 1 metro a cada 10 minutos - e o asfalto estava parecendo magma. o suor descia pelo rosto encharcando sua camisa e uma mosca varejeira estava desde botafogo querendo entrar no seu ouvido. toc toc toc. valdir olhou pra porta da frente e uma cabeça iluminada à luz do sol ofuscou seus olhos. ele abriu a porta e uma doce velhinha subiu no ônibus.
- obrigado motorista. posso ficar aqui na frente?
- lógico minha doce sehhorinha.
acelerou e saiu arrancando passando as marchas freneticamente e se a velhinha não tivesse se agarrado à roleta ela teria voado pela porta da frente ainda aberta. o termômetro da rua jardim botânico marcava 38 graus e o 179 estava lotado nessa manhã de sexta-feira. todos no ônibus fitavam o avatar no vidro atrás do motorista com o são jorge matando o dragão. o celular do valdir tocou. ele atendeu passando rasgando os sinais vermelhos com apitos de guardas e fodam-se todos.
"sim fala! (pausa) mas eu já te falei mil vezes porra! o que eu posso fazer! to trabalhando pra caralho, to desde ontem nessa porra e já to dobrando hoje! o que mais vc quer que eu faça? (pausa) o quê? o que ele está fazendo? faz alguma coisa madalena! sou sempre eu que tenho que resolver tudo? tá me achando com cara de atlas?" - valdir jamais se esquecera da figura do atlas carregando o globo em suas costas na capa de um livro em um sebo na rua da carioca - "ô madalena, que barulheira é essa de cachorro aí atrás??? (grande pausa)" o ônibus estava chegando no túnel zuzu angel e valdir depois de escutar algo que o deixou com os olhos arregalados pegou o telefone e zuniu pela janela. a velhinha olhou para valdir também com os olhos arregalados e ele olhou pra ela e disse: "é minha senhora, quanto mais eu rezo mais assombração me aparece". a mosca varejeira conseguiu nesse exato momento entrar em seu ouvido e ele na tentativa de tirar o bicho de lá perdeu o controle da direção por um momento e fechou um cara que tava passando com um alfa romeu. o cara freiou bruscamente - sons de freios e buzinas ecoaram pelo túnel - e valdir conseguiu tirar a mosca de seu ouvido. a sineta da parada do ônibus começou a tocar - era a garotada da escola pública brincando e fazendo algazarra dentro do ônibus. o cara do alfa romeu passou ao lado do ônibus e buzinou e buzinou e buzinou e sinetas do ônibus e gargalhadas e buzinou e parou bem ao lado do ônibus e abaixou o vidro. valdir olhou pro cara e o cara olhou pro valdir com seu óculos ray ban e falou em alto e bom som: "seu arrombado de merda! vai tomar no cú!". aí então algo aconteceu: valdir olhou pra frente e ficou apático por alguns segundos. a velinha ficou fitando bem valdir. seu rosto ficou pálido; parecia que todas as forças dele tinham ido embora e com um olhar vago semi morimbundo ficou parado olhando sem piscar para a luz lá na frente do túnel. o cara do alfa romeu fechou o ônibus e fez aquele clássico sinal com a mão que representa uma piroca. valdir ficou olhando para frente e pra mão em forma de piroca com a boca aberta ainda sem piscar com as pálpebras meio caídas sem vida alguma, uma cena realmente triste de se ver. a velinha continuou olhando pro valdir com cara de assustada quando ela reparou que a mão de valdir começou a tremer. ele tirou de seu bolso uma bombinha de asma e deu uma bombada. valdir então começou a gargalhar, a uivar e a espumar...
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