domingo, maio 15, 2005

Mostrar-se

Faço parte deste mundo. Mesmo que não queira, faço parte. Sou um corpo animado, vivo, que perambula por essa terra abstrata de ninguém. Instinto de aparecer, diriam os pós-modernos. O ser humano aparece como fenômeno para si e para os outros. Quer queira, quer não. Tudo o que faço, tem uma consequência, por mais que isso seja tudo o que não quero. Quero viver minha vida em paz, sem consequências para ninguém. Praticamente tudo o que mostro, não é o que quero mostrar. De qualquer jeito, me mostro. Insconscientemente, me mostro. Como diria Heráclito, quando os meninos se entretinham a catar piolhos disseram: "Tudo o que vimos, tiramos, o que não vimos, carregamos conosco". O que mostro para os outros é pouco, mas ainda sim é mais do que desejaria mostrar. Permanece o essencial, o triste, o secreto dentro de mim, a me corroer, a dilacerar todo o amor. Mas ainda assim, meus atos, minhas ações, expressões, intelecções, falam mais do que gostaria que falassem. Falam por mim, mais do que eu próprio falo de fato. Meu silêncio, minha abstinência da vida, fala mais do que mil palavras que eu poderia escolher, falariam. Ainda assim, permanece o essencial. Ou não? Talvez eu diga tudo, talvez todos saibam do que eu mesmo não tenho conhecimento em mim mesmo. Talvez só hesitem em falar. Sabem de tudo, mas não falam. Observam como se observa um macaco no zóológico. Dizem eles por dentro: "Olha lá, como ele é inteligente, até parece que está tentando falar algo. Olha só, ele gosta de bananas. Ih! aquele gemido parecia que ele estava realmente dizendo algo.Meu Deus, será que ele não vê que é um macaco? Nossa, como ele parece humano". Falo mais do que gostaria de falar. Ou do que posso falar. Como se não soubessem. Como se eu pudesse esconder. Não há nada escondido, não há mistérios em meu ser, em minha pessoa, assim como não há mistérios no mundo. O que há, são mal intérpretes. Não conseguem ver além daquilo que vêem com os próprios olhos. Mesmo que esse além esteja tão nitido quanto o mais físico, mais material que um objeto pode ser. Não há metafísica, só há cegos. E numa terra de cegos, aquele que só tem um olho é rei.

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